Ambos são países continentais. Distantes da Europa, foram ambos povoados por europeus, adotaram línguas europeias, embora, em suas terras, já vivesse um povo nativo. Ergueram-se com trabalho escravo africano. Tornaram-se repúblicas. Tiveram corridas do ouro. Em suas semelhanças, são únicos. E, no entanto, Brasil e Estados Unidos terminaram bastante diferentes. O porquê é polêmico. Mas um dos autores que mergulhou mais fundo neste debate é raramente lembrado fora dos meios acadêmicos: o gaúcho Clodomir Vianna Moog, que em 1955 publicou Bandeirantes e Pioneiros. Não é um livro difícil de achar nas livrarias. (Aqui, na Amazon.br ou, para quem preferir, há um bom resumo online.)
O fascínio com os EUA não é uma constante na história brasileira. Ele foi intenso na Minas dos anos 1780, época em que os inconfidentes devoravam tudo o que seus contemporâneos escreviam sobre a revolução dos americanos ingleses. Durante o Império, o fascínio mudou de lado e recaiu nos ingleses. Mas, da República para cá, apesar de flertes com França ou mesmo Alemanha, o exemplo norte-americano é o único constantemente lembrado por quem busca (com ou sem razão) uma ideia de Brasil alternativo, um exemplo a seguir.
Moog sugere algumas explicações interessantes. E começa com a geografia. Quando os ingleses chegaram à costa atlântica da América do Norte, encontraram quilômetros e quilômetros de planície. Os portugueses, por sua vez, depararam-se com escudos como as serras do Mar, da Mantiqueira e do Espinhaço, que nos séculos 16 e 17 dificultaram imensamente a ocupação do interior. O problema não é só geológico, é também hidrográfico. A bacia do Mississipi banha a maior superfície contínua de terras cultiváveis que existe. Não há equivalente brasileiro. Apenas navegando por rios e lagos é possível ir de Nova York a Chicago ou ao Canadá, de Minnesota a Nova Orleans. Nem o São Francisco, interrompido pela cachoeira de Paulo Afonso, oferece navegabilidade igual. Ocupar o território americano e transportar produtos de um canto ao outro do país foi fácil e barato. No Brasil, não.
Há também a questão paralela do clima e dos recursos naturais. Europeus sabiam lidar com climas temperados mas não com tropicais. Além disso, o clima tropical tem um defeito (por incrível que pareça) terrível: é quente. Não requer calefação. Uma sociedade que não precisou correr atrás de calefação não investiu, nos séculos de formação, na tecnologia que seria necessária para disparar o processo industrial. E é aí que bate a questão dos recursos. Rico em ferro, o Brasil é pobre em carvão mineral. Em meados do século 17, quando surgiram aqui e ali as primeiras indústrias, estávamos vendidos. Nem tecnologia para grandes fornos, nem carvão.
O argumento de Moog, porém, não culpa apenas a roleta russa natural. O bandeirante e o pioneiro eram tipos de todo distintos. Embrenhando-se no meio do mato, o bandeirante desejava caçar índios para escravizar, descobrir riquezas, pegar o que desse e voltar para casa. Sonhava em tornar-se rico e voltar ao reino. Os portugueses vinham para o Brasil sem suas mulheres. Estavam de passagem. Os pioneiros, não. Mudaram-se com suas famílias. Conforme foram lentamente avançando em direção à costa pacífica, iam fixando-se. Precisavam construir uma vida decente ali.
A diferença não estava apenas nas estratégias de Portugal e Inglaterra. Portugal era um país pequeno, de população pequena, que jamais conseguiria implementar um grande projeto de povoamento. A Inglaterra tinha muito mais gente. Gente e guerras. Revoluções e revoltas sangrentas, por disputas sucessórias e religiosas, uma instabilidade que contribuía como incentivo para emigração definitiva.
Em 1820, o Brasil tinha uma população de 4,7 milhões. Os EUA, de 9,6. Em 1860, década da Guerra Civil lá e do Paraguai, aqui, chegávamos a 8,4 milhões de brasileiros. Contra 31,4 milhões de americanos. São braços produzindo riqueza. Riqueza mais barata de transportar.
Em 2020, seremos 220 milhões contra 335 milhões.